Olá Colegas,
O texto a seguir foi escrito pelo Professor Gabriel Perissé em 2011, mas o teor do mesmo é muito pertinente. Uma crítica aos textos do Gustavo Ioschpe, colunista da "Veja" e suas sandices sobre os problemas da educação no Brasil.
O professor Gabriel Perissé desconstrói alguns argumentos do "colunista" da Veja de forma brilhante. Vale a pena ler.
E você, o que pensa sobre a grande imprensa no Brasil ? Compartilhe suas ideias aqui no blog. Comente.
Boa Leitura!
Mirtes
LEITURAS DE VEJA
Palpites dogmáticos
Por Gabriel Perissé em 18/01/2011 na edição 625
A revista Veja não economiza espaço quando se
trata de divulgar os palpites de Gustavo Ioschpe sobre educação. Não haveria um
articulista mais articulado para essa tarefa? Ou, pensando melhor, Ioschpe eVeja vivem em total harmonia. As afirmações
de um, abalizadas pela outra, demonstram, apesar do tom peremptório e seguro,
uma fragilidade teórico-prática impressionante.
Ioschpe costuma aludir a
pesquisas (não especificando, na maioria das vezes, que pesquisadores são
esses, que pesquisas são essas, onde consultá-las), dando como líquido e certo
tal ou qual verdade. NaVeja de
13/10/2010, por exemplo, escreveu um artigo, "Educação de qualidade: de
volta ao futuro", do qual destaco o seguinte trecho:
"[...] as pesquisas empíricas [...] mostram que a
presença de computadores nas escolas não tem nenhum impacto sobre o
aprendizado."
Contudo, já no final do
século 20, pesquisadores do mundo inteiro reuniam experiências que demonstravam
como a utilização de computadores e da internet tornam as práticas docentes
motivadoras. Bastaria citar um estudo de 1998, "The
emerging contribution of online resources and tools to classroom learning and
teaching", e, para entender a necessidade de a escola ingressar na
Idade Mídia, o livro de Don Tapscott, A
hora da geração digital (Agir
Negócios, 2010).
"Sindicatos mais poderosos pressionam para que o
grosso da verba de educação seja gasto em aumentos salariais e diminuição do
número de alunos em sala de aula, duas variáveis que não têm relação com a
qualidade de ensino."
Tentativa de
corrigir uma injustiça
Contudo, qualquer psicopedagogo, qualquer educador haverá de nos
dizer que em turmas reduzidas o professor conseguirá dar atenção mais
individualizada, poderá perceber melhor progressos e dificuldades de cada
aluno, detectando os problemas e intervindo com mais eficácia. E, quanto aos
salários, é difícil acreditar que pesquisadores (motivados por bolsas de
estudos, talvez com ajuda do exterior...) dediquem seu tempo para descobrir que
aumentos salariais não motivam professores...
Em dezembro do ano passado,
visivelmente abalado com a vitória de Dilma Rousseff, Ioschpe, em novo artigo (Veja,
29/12/2010), intitulado "Aumentaram os gastos, mas a qualidade...",
teve a coragem de escrever:
"[...] esse governo [federal] foi extremamente
generoso nas concessões e omisso nas cobranças. Instituiu um piso nacional de
salário para o magistério, atualmente em 1.024,00 reais. O salário médio do
professor brasileiro subiu de 994 reais em 2003 para 1.527,00 reais em 2008
[...]. O governo, porém, não fez nenhuma intervenção mais forte nos cursos de
formação de professores das próprias universidades federais, que continuam
despejando no mercado profissionais despreparados para o exercício da
docência."
Ora, não se pode usar o advérbio "extremamente" em
relação a uma generosidade nada extrema. Aliás, nem de generosidade se trata,
mas da tentativa (tardia!) de corrigir uma injustiça: o salário de um professor
de escola pública com diploma universitário equivale, hoje, a 60% do que recebem,
em média, profissionais com o mesmo nível de ensino.
Realidade se resume
a poucas palavras
E não são as universidades federais que "despejam"
professores despreparados no mercado! Na década de 1990, calculava-se que 80%
dos professores da rede pública estadual de São Paulo formaram-se em faculdades
privadas. Em 2008, o MEC divulgou estudo segundo o qual 70% dos professores
aptos a lecionar no ensino básico do Brasil formaram-se em faculdades e
universidades particulares.
Andar na contramão da realidade pode provocar acidentes. No caso
de Ioschpe, suas declarações entram em rota de colisão com o óbvio. Nem
precisaríamos recorrer a teses de doutorado ou pesquisas financiadas por bancos
ou assemelhados. Em novembro e dezembro de 2010, e neste mês de janeiro, o articulista
publicou em três partes um artigo cujo título não é nada ambicioso: "Como
melhorar a educação brasileira". Basta-nos ler (e brevemente comentar)
alguns dos seus melhores momentos...
"Muitos professores chegam
atrasados a suas aulas. Perdem tempo fazendo chamada, dando recados e
advertências. É um desperdício" (Veja, 10/11/2010).
Correto. Mas essa constatação é insuficiente. Por que muitos
professores chegam atrasados? E por que a chamada é tão prolongada (ao mesmo
tempo que exigida pela burocracia escolar)? E por que cabe aos professores
darem recados e advertências? Se Ioschpe fizesse as perguntas certas aos que
vivem essas realidades estaria realizando verdadeira pesquisa empírica e
acabaria por descobrir uma realidade que se pode resumir em poucas palavras:
professores sobrecarregados e turmas com grande número de alunos.
Uma breve pesquisa
informa o óbvio
Outro momento de Ioschpe, influenciado pelos noticiários sobre o
Morro do Alemão:
"É curioso: nossos governantes
criaram coragem para invadir o Morro do Alemão, mas as universidades públicas
continuam sendo consideradas território perigoso demais para a ação saneadora
do estado. Esculachar bandido armado de metralhadora é mais fácil do que peitar
os doutores da academia, que permanecem livres para perpetrar seus delitos
intelectuais" (Veja, 22/12/2010).
Mais do que curioso... é incrível que alguém possa, impunemente,
comparar bandidos e professores universitários! Que tipo de "limpeza"
deveria ser feita nas universidades públicas? Não seria o caso de imaginar que
as particulares merecem igual ou maior rigor?
Um último parágrafo:
"Em termos de regime de
trabalho, ao contrário dos desejos dos sindicatos, a maioria das pesquisas
mostra que não faz diferença, para o aprendizado do aluno, quantos empregos o
professor tem, se trabalha em uma escola ou mais" (Veja,
19/01/2011).
De novo, impressiona ler uma afirmação dessas. Será que, além de
desconhecer a escola pública, Ioschpe ignora a realidade vantajosa das escolas
particulares, cujos alunos obtêm os melhores resultados no Enem?
Uma breve pesquisa na internet informa o óbvio. As melhores
escolas possuem laboratórios, computadores e biblioteca. Seus professores são
bem remunerados, o que lhes permite dedicação exclusiva, ou quase exclusiva,
com tempo necessário para prepararem aulas inovadoras, em geral empregando
recursos tecnológicos.
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